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O caráter de Deus é ter misericórdia de todos (Rm 9—11)

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Amy hirschi k0c8ko3e6aa unsplash 72dpi

Em Romanos 9—11, Paulo volta ao problema imediato que a carta tem o propósito de abordar: o conflito entre cristãos judeus e gentios. Como essa não é nossa principal preocupação na teologia do trabalho, vamos resumir rapidamente.

Paulo discute o relacionamento de Deus com Israel, com atenção especial à misericórdia divina (Rm 9.14-18 ). Ele explica como a salvação de Deus se dá também para os gentios. Os judeus experimentaram a salvação de Deus primeiro, começando com Abraão (Rm 9.4-7). Mas muitos se desviaram e, no momento, parece que os gentios são mais fiéis (Rm 9.30-33 ). Estes, porém, não devem se tornar críticos, pois sua salvação está entrelaçada com a dos judeus (Rm 11.11-16). Deus preservou um “remanescente” de seu povo (Rm 9.27; 11.5) cuja fidelidade — pela graça de Deus — leva à reconciliação do mundo.

Para judeus e gentios, então, a salvação é um ato da misericórdia de Deus, não uma recompensa pela obediência humana (Rm 9.6-13). Com isso em mente, Paulo assume uma série de argumentos de ambos os lados, sempre concluindo que “Deus tem misericórdia de quem ele quer” (Rm 9.18). Nem judeus nem gentios são salvos por suas próprias ações, mas pela misericórdia de Deus.

A salvação dada por Deus, diz Paulo, vem por confessar Jesus como Senhor e por crer que Deus o ressuscitou dentre os mortos (Rm 10.9-10). Em outras palavras, a salvação vem para todo aquele que confia no poder vivificante de Deus, que enriquece a vida de judeus e gentios que seguem Jesus como Senhor (ver Rm 10.12-13). A desobediência — seja de gentios seja de judeus — fornece a Deus a oportunidade de mostrar ao mundo a sua misericórdia para com todos (Rm 11.33). A preocupação de Paulo nesta carta é reconciliar relacionamentos rompidos entre judeus e gentios seguidores de Jesus.

Romanos 9—11 oferece esperança a todos nós no trabalho e no local de trabalho. Primeiro, Paulo enfatiza o desejo de Deus de ter misericórdia dos desobedientes. Todos nós, em um ponto ou outro de nossa vida profissional, falhamos em incorporar a fé e a fidelidade de Cristo em algum aspecto do trabalho. Se Deus tem misericórdia de nós (Rm 11.30), somos chamados a ter misericórdia dos outros no trabalho. Isso não significa ignorar o mau desempenho ou ficar calado diante de assédio ou discriminação. Misericórdia não é permissão para oprimir. Em vez disso, significa não permitir que as falhas de uma pessoa nos levem a condená-la totalmente. Quando alguém com quem trabalhamos comete um erro, não devemos julgá-lo como incompetente, mas ajudá-lo a se recuperar do erro e aprender a não repeti-lo. Quando alguém viola nossa confiança, devemos responsabilizá-lo e, ao mesmo tempo, oferecer-lhe perdão, que, se recebido com arrependimento, cria um caminho para restabelecer a confiança.

Em segundo lugar, esta seção da carta nos lembra de nossa responsabilidade de perseverar como cristãos fiéis, para que possamos ser os “remanescentes” fiéis (Rm 11.5) em nome daqueles que tropeçaram temporariamente na obediência da fé. Quando vemos as pessoas ao redor falharem, nossa tarefa não é julgá-las, mas nos colocarmos no lugar delas. Talvez nossa fidelidade possa mitigar o dano causado a outros e até livrar aqueles que o causaram de um castigo severo. Se virmos um colega maltratando um cliente ou um subordinado, por exemplo, talvez possamos intervir para corrigir a situação antes que ela se torne uma causa de demissão. Quando nos lembramos de quão perto chegamos de tropeçar ou de quantas vezes falhamos, nossa resposta às falhas dos outros é misericórdia, assim como a de Cristo. Isso não significa que permitimos que as pessoas abusem das outras. Significa que nos colocamos em risco, assim como Cristo, pela redenção de pessoas que erraram sob o poder do pecado.

Terceiro, esses capítulos nos lembram de demonstrar aos demais colegas como é a obediência da fé na vida e no trabalho diários. Se realmente andarmos em novidade de vida (ver “Andando em novidade de vida” em Romanos 6) e decidirmos que nossas ações podem trazer nova qualidade de vida para aqueles ao redor (ver “Viver de acordo com o Espírito leva a uma nova qualidade de vida” em Romanos 8), os outros não serão atraídos a fazer o mesmo? Nossas ações no trabalho podem ser o louvor mais alto que podemos oferecer a Deus e o testemunho mais atraente que nossos colegas de trabalho já viram. O desejo de Deus é que todos no mundo se reconciliem com ele e uns com os outros. Assim, cada aspecto de nosso trabalho e vida se torna uma oportunidade de testemunhar de Cristo — de ser um dos agentes reconciliadores de Deus no mundo.

Quarto, precisamos permanecer humildes. Quando nós, assim como as facções para quem Paulo estava escrevendo, julgamos nossa posição superior à daqueles ao redor, imaginamos que temos uma ligação direta com Deus. Paulo fala diretamente contra essa arrogância. Não sabemos tudo sobre como Deus está trabalhando nos outros. Como diz o general Peter Pace, presidente aposentado do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas dos EUA: “Você deve sempre dizer a verdade como a conhece e deve entender que há muita coisa que você não sabe”. [1]

As maneiras específicas pelas quais incorporamos esse ministério da reconciliação no mundo são tão diversas quanto o próprio trabalho e o local de trabalho. Assim, nos voltamos para Romanos 12 para obter mais orientação de Paulo sobre como discernir maneiras de praticar o amor reconciliador de Deus no trabalho.