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As bem-aventuranças (Mateus 5.1-12)

Comentário Bíblico / Produzido por Projeto Teologia do Trabalho
Matthew the beatitudes matthew 5 1 12

O Sermão do Monte começa com as bem-aventuranças — oito declarações que iniciam com a expressão bem-aventurados.[1] Esta expressão afirma um estado de bênção que já existe. Cada bem-aventurança declara que um grupo de pessoas normalmente consideradas afligidas são, na verdade, abençoadas. Os abençoados não precisam fazer nada para obter essa bênção. Jesus simplesmente declara que eles já foram abençoados. Assim, as bem-aventuranças são antes de mais nada declarações da graça de Deus. Não são condições de salvação ou orientações para obter entrada no Reino do Deus.

Aqueles que pertencem a cada um dos grupos abençoados experimentam a graça de Deus porque o Reino dos céus chegou. Considere a segunda bem-aventurança — “Bem-aventurados os que choram” (Mateus 5.4). Normalmente as pessoas não pensam no choro como uma bênção. É uma tristeza. Mas, com a chegada do Reino dos céus, chorar se torna uma bênção porque aqueles que choram “serão consolados”. A implicação é que o próprio Deus proverá o consolo. A aflição do chorar se torna a bênção do profundo relacionamento com Deus. Isso é de fato uma bênção!

Embora o propósito original das bem-aventuranças seja declarar as bênçãos concedidas pelo Reino de Deus, a maioria dos estudiosos também considera que elas pintam um retrato do caráter desse reino.[2] Ao entrarmos no Reino de Deus, esperamos nos tornar mais semelhantes àqueles que são chamados de bem-aventurados — mais humildes, mais misericordiosos, com mais fome e sede de justiça, mais aptos a promover a paz e assim por diante. Isso dá às bem-aventuranças um imperativo moral. Mais tarde, quando Jesus diz “façam discípulos de todas as nações” (Mateus 28.19), as bem-aventuranças descrevem o caráter que esses discípulos devem assumir.

As bem-aventuranças descrevem o caráter do Reino de Deus, mas não são condições de salvação. Jesus não diz, por exemplo, que “apenas os puros de coração podem entrar no Reino dos céus”. Essa é uma boa notícia, pois as bem-aventuranças são absurdamente difíceis de serem cumpridas. Uma vez que Jesus diz que “qualquer que olhar para uma mulher para desejá-la, já cometeu adultério com ela no seu coração” (Mateus 5.28), quem poderia ser verdadeiramente “puro de coração” (Mateus 5.8)? Se não fosse pela graça de Deus, ninguém seria verdadeiramente bem-aventurado. As bem-aventuranças não são um julgamento contra todo aquele que deixa de atingir um padrão. Em vez disso, são uma bênção para qualquer um que consentir em se juntar ao Reino de Deus uma vez que ele “está próximo”.

Uma graça adicional das bem-aventuranças é o fato de que elas abençoam a comunidade de Deus, e não apenas os indivíduos de Deus. Ao seguirmos Jesus, nós nos tornamos bem-aventurados membros da comunidade do Reino, mesmo que nosso caráter ainda não esteja formado na semelhança a Deus. Individualmente, deixamos de cumprir as características de algumas ou de todas as bênçãos. Mas somos abençoados, todavia, pelo caráter da comunidade inteira ao nosso redor. A cidadania no Reino de Deus começa agora. O caráter da comunidade do Reino será aperfeiçoado quando Jesus retornar, “vindo nas nuvens do céu com poder e grande glória” (Mateus 24.30).

De posse dessa compreensão, estamos prontos para explorar o caráter específico de cada uma das bem-aventuranças e analisar como elas se aplicam ao trabalho. Não podemos tentar discutir cada uma das bem-aventuranças de maneira exaustiva, mas esperamos poder lançar o fundamento para receber as bênçãos e colocar em prática as bem-aventuranças em nosso trabalho diário.[3]

“Bem-aventurados os pobres em espírito, pois deles é o Reino dos céus” (Mateus 5.3)

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Os “pobres em espírito” são aqueles que se lançam na graça de Deus.[1] Reconhecemos pessoalmente nossa falência espiritual diante de Deus. É o publicano no templo, batendo no peito e dizendo “Deus, tem misericórdia de mim, que sou pecador” (Lucas 18.13). É uma confissão honesta de que somos pecadores e totalmente destituídos das virtudes morais necessárias para agradar a Deus. É o oposto da arrogância. Em sua forma mais profunda, reconhece nossa necessidade desesperada de Deus. Jesus está declarando que é uma bênção admitir que carecemos de ser cheios da graça de Deus.

Assim, logo no início do Sermão do Monte aprendemos que não temos em nós mesmos os recursos espirituais necessários para colocar os ensinamentos de Jesus em prática. Não podemos cumprir o chamado de Deus por nossos próprios meios. Bem-aventurados são aqueles que percebem que são espiritualmente falidos, pois essa percepção os leva até Deus, sem o qual não podemos cumprir aquilo que fomos criados para ser e fazer. A maior parte do restante do sermão arranca de nós a ilusão de que somos capazes de conquistar um estado de bênção por nossas próprias forças. O objetivo é produzir em nós uma genuína pobreza de espírito.

Qual é o resultado prático dessa bênção? Se somos pobres em espírito, então temos a capacidade de produzir uma avaliação honesta de nós mesmos em relação ao nosso trabalho. Não inflamos nosso currículo nem nos vangloriamos de nossa posição. Sabemos quão difícil é trabalhar com pessoas que não conseguem aprender, crescer ou aceitar a correção porque estão tentando manter uma imagem envaidecida de si próprias. Assim, nos comprometemos com a honestidade em relação a nós mesmos. Lembramo-nos de que até mesmo Jesus, quando começou a trabalhar com madeira, deve ter precisado de orientação e instrução. Ao mesmo tempo, reconhecemos que apenas tendo Deus trabalhando dentro de nós é que podemos colocar os ensinamentos de Jesus em prática no nosso emprego. Procuramos a presença e a força de Deus em nossa vida a cada dia ao vivermos como cristãos no lugar onde trabalhamos.

No mundo caído, a pobreza de espírito pode aparentar ser um impedimento para o sucesso e o avanço. É comum que isso seja uma ilusão. Quem tem mais probabilidade de ser bem-sucedido no longo prazo: um líder que diz “não tenha medo, eu consigo lidar com qualquer coisa, simplesmente faça o que eu digo” ou um líder que diz “juntos conseguiremos fazer isso, mas todo mundo terá de se esforçar muito mais do que antes”? Se já houve um tempo em que um líder arrogante e em busca de autopromoção foi considerado maior do que um líder humilde e capacitador, este tempo está passando, pelo menos dentro das melhores organizações. Um líder humilde, por exemplo, é a primeira marca característica de empresas que alcançam grandeza sustentável, de acordo com a renomada pesquisa de Jim Collins.[2] Naturalmente, muitos ambientes de trabalho permanecem presos ao velho reino da autopromoção e da autovalorização exagerada. Em algumas situações, o melhor conselho prático pode ser encontrar outro lugar para trabalhar, se isso for possível. Em outros casos, deixar o emprego pode não ser possível, ou pelo menos não desejável, porque, ao permanecer, um cristão pode ser uma força importante para o bem. Nessas situações, os pobres de espírito são uma bênção ainda maior para os que estão ao redor deles.

“Bem-aventurados os que choram, pois serão consolados” (Mateus 5.4)

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A segunda bem-aventurança aprofunda o reconhecimento mental que fazemos de nossa pobreza de espírito ao adicionar uma resposta emocional de tristeza. Quando enfrentamos o mal em nossa própria vida, ele nos entristece; quando encaramos o mal no mundo — o que inclui possíveis males em nosso local de trabalho — isso também toca nossas emoções com o lamento. O mal pode vir de nós mesmos, de outros ou de fontes desconhecidas. Seja qual for o caso, quando choramos honestamente por palavras, ações e políticas malignas no trabalho, Deus vê a nossa tristeza e nos conforta com o reconhecimento de que não será sempre dessa maneira.

Os que são abençoados pelo choro em relação aos seus próprios fracassos podem receber conforto ao admitir seus erros. Se cometermos algum erro para com um colega de trabalho, um aluno, um cliente, um funcionário ou outra pessoa, admitimos isso e pedimos o perdão da outra parte. É uma atitude que exige coragem! Sem a bênção emocional da tristeza relacionada às nossas ações, provavelmente jamais reuniríamos as forças para admitir nossos erros. Mas, se o fizermos, podemos nos surpreender com a prontidão das pessoas em nos perdoar. E se, ocasionalmente, outros tirarem vantagem de nossa admissão de uma falha, podemos contar com a bênção da não arrogância que flui da primeira bem-aventurança.

Algumas empresas descobriram que expressar tristeza é uma maneira eficiente de operar. A empresa Toro, que fabrica de tratores e cortadores de grama, adotou a prática de mostrar preocupação pelas pessoas que se feriram ao usar seus produtos. Assim que toma conhecimento de alguém que se feriu, a empresa entra em contato com a pessoa afetada para expressar sua tristeza e oferecer ajuda. Ela também pede sugestões sobre como melhorar o produto. Por mais surpreendente que possa parecer, essa abordagem diminuiu o número de processos legais por parte de consumidores considerando um período de muitos anos.[1] O Hospital Virginia Mason alcançou resultados semelhantes a partir do reconhecimento de seu papel na morte de pacientes.[2]

“Bem-aventurados os humildes, pois eles receberão a terra por herança” (Mateus 5.5)

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A terceira bem-aventurança intriga muitas pessoas no ambiente de trabalho, em parte porque não entendem o que significa ser humilde. Muitos presumem que o termo significa ser fraco, domesticado ou sem coragem. Mas o entendimento bíblico de humildade é poder sob controle. No Antigo Testamento, Moisés foi descrito como o homem mais humilde da terra (Números 12.3, NVT). Jesus descreveu a si mesmo como alguém “manso e humilde” (Mateus 11.28-29), o que era condizente com sua ação vigorosa na purificação do templo (Mateus 21.12-13).

Poder sob o controle de Deus significa duas coisas: 1) uma recusa a inflar nossa autoavaliação e 2) uma reserva em nos impormos em favor de nós mesmos. Paulo captura o primeiro aspecto perfeitamente em Romanos 12.3: “Pois pela graça que me foi dada digo a todos vocês: ninguém tenha de si mesmo um conceito mais elevado do que deve ter; mas, pelo contrário, tenha um conceito equilibrado, de acordo com a medida da fé que Deus lhe concedeu”. As pessoas humildes veem a si próprias como servas de Deus, sem se consideraram superiores além do que deveriam pensar. Ser humilde é aceitar nossas forças e limitações exatamente como são, em vez de constantemente tentarmos retratar a nós mesmos sob a melhor luz possível. Mas isso não significa que devemos negar nossos pontos fortes e habilidades. Quando perguntado se era o Messias, Jesus respondeu: “Os cegos veem, os mancos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e as boas-novas são pregadas aos pobres; e feliz é aquele que não se escandaliza por minha causa” (Mateus 11.4-6). Ele não tinha nem uma autoimagem inflada nem um complexo de inferioridade, mas o coração de um servo fundamentado naquilo que Paulo mais tarde chamaria de “conceito equilibrado” (Romanos 12.3).

O coração de um servo é o ponto crucial do segundo aspecto da humildade: reserva em nos impormos em favor de nós mesmos. Exercemos o poder, mas para benefício de todas as pessoas, não apenas de nós mesmos. O segundo aspecto é captado pelo texto de Salmos 37.1-11a, que começa com “não se aborreça por causa dos homens maus” e termina com “os humildes receberão a terra por herança”. Significa que refreamos nosso desejo de vingar os erros cometidos contra nós e, em vez disso, usamos qualquer poder que tenhamos para servir os outros. Flui da tristeza de nossa própria fraqueza, que compreende a segunda bem-aventurança. Se nos sentirmos tristes por causa de nossos próprios pecados, poderemos realmente nos sentir vingativos em relação aos pecados dos outros?

Pode ser bastante desafiador colocar nosso poder em ação debaixo do controle de Deus. Em um mundo caído, parece que o agressivo e o que se autopromove é quem segue adiante. “Você não recebe o que merece, você recebe o que negocia.”[1] No ambiente de trabalho, o arrogante e o poderoso parecem vencer, mas, no final, eles perdem. Eles não ganham nos relacionamentos pessoais. Ninguém quer um amigo arrogante e autocentrado. Homens e mulheres famintos por poder costumam ser pessoas solitárias. Também não alcançam segurança financeira. Pensam que possuem o mundo, mas o mundo é que as possui. E quanto mais dinheiro têm, menos segurança financeira sentem.

Em contraste, Jesus disse que os humildes “receberão a terra por herança”. Como já vimos, a terra se tornou o local do Reino dos céus. Nossa tendência é pensar no Reino dos céus como céu, um lugar completamente diferente (ruas de ouro, portões de pérola, mansões em colinas) daquilo que conhecemos aqui. Mas a promessa de Deus ligada ao Reino é um novo céu e uma nova terra (Apocalipse 21.1). Aqueles que submeterem seu poder a Deus herdarão o Reino perfeito que vem à terra. Nesse Reino, recebemos pela graça de Deus as coisas boas pelas quais o arrogante luta inutilmente na terra atual, e muito mais. E isso não é apenas uma realidade futura. Até mesmo em um mundo caído aqueles que reconhecem suas verdadeiras forças e fraquezas podem encontrar paz ao viver de forma realista. Aqueles que exercem o poder em benefício de outras pessoas normalmente são admirados. O humilde envolve outros no processo de decisão e experimenta melhores resultados e relacionamentos mais profundos.

“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, pois serão satisfeitos“ (Mateus 5.6)

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A compreensão da quarta bem-aventurança requer um entendimento daquilo que Jesus chamou de justiça. No judaísmo antigo, justiça significava “inocentar, vindicar, restaurar a um relacionamento correto”.[1] Os justos são aqueles que mantêm relacionamentos justos — com Deus e com as pessoas ao redor deles. Com base em relacionamentos justos, aqueles que cometem infrações são inocentados da culpa.

Você recebeu a bênção de relacionamentos justos em abundância? Isso é resultado da humildade (a terceira bem-aventurança), porque só podemos formar relacionamentos justos com outras pessoas quando deixamos de fazer com que todas as nossas ações girem em torno de nós mesmos. Você tem fome e sede de relacionamento justos — com Deus, com seus colegas de trabalho, com sua família e com sua comunidade? A fome é um sinal de vida. Seremos genuinamente famintos por bons relacionamentos se ansiarmos por outros por causa deles próprios, não apenas como petiscos para satisfazer nossas próprias necessidades. Se entendermos que temos a graça de Deus para isso, teremos fome e sede de relacionamentos justos, não apenas com Deus, mas também com as pessoas com quem trabalhamos ou vivemos.

Jesus disse que aqueles que têm essa fome terão seu apetite satisfeito. É fácil ver os erros em nosso local de trabalho e querer batalhar para consertá-los. Se fizermos isso, estaremos famintos e sedentos por justiça, desejando que os erros sejam corrigidos. A fé cristã tem sido a fonte de muitas das maiores reformas realizadas no mundo do trabalho, talvez sendo as mais notáveis a Abolição da Escravatura na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos e a gênese do Movimento dos Direitos Civis. Mais uma vez, porém, o fluxo das bem-aventuranças é importante. Não nos envolvemos nessas batalhas com base em nossas próprias forças, mas apenas em reconhecimento de nosso próprio vazio, chorando nossa própria injustiça e submetendo nosso poder a Deus.

“Bem-aventurados os misericordiosos, pois obterão misericórdia” (Mateus 5.7)

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Se você for bem-aventurado pela tristeza que sente por suas próprias falhas (a segunda bem-aventurança) e pelos relacionamentos justos (a quarta bem-aventurança), então não encontrará dificuldade para mostrar misericórdia aos outros, tanto no trabalho como em qualquer outro lugar. A misericórdia consiste em tratar as pessoas de um modo melhor do que elas merecem de nós. O perdão é um tipo de misericórdia. O mesmo vale quanto a acudir alguém a quem não temos obrigação de ajudar, ou refrear-nos de explorar a vulnerabilidade de uma pessoa. Em todos esses sentidos, a misericórdia é a força motriz da encarnação, da morte e da ressurreição de Cristo. Através dele, nossos pecados são perdoados e nós mesmos recebemos ajuda por meio do dom do espírito de Deus (1Coríntios 12). A razão de o Espírito nos mostrar essa misericórdia é simplesmente o fato de Deus nos amar (João 3.16).

No trabalho, a misericórdia tem um aspecto altamente prático. Devemos ajudar os outros a alcançar seus melhores resultados, independentemente de como nos sintamos em relação a essas pessoas. Quando ajuda um colega de trabalho, de quem você talvez não goste e que talvez possa até mesmo tê-lo prejudicado no passado, você está mostrando misericórdia. Quando você é o primeiro participante de uma audição e adverte os demais de que o juiz está de mau humor, você está mostrando misericórdia, ainda que isso possa dar a eles vantagem em relação a você. Quando o filho de um concorrente está adoentado e você concorda em remarcar sua apresentação para o cliente de modo que o seu concorrente não tenha de escolher entre cuidar do filho e concorrer a um negócio, você está mostrando misericórdia.

Esses tipos de misericórdia podem lhe custar uma vantagem que, em outras circunstâncias, estaria disponível a você. Contudo, elas beneficiam o resultado do trabalho, assim como a outra pessoa. Auxiliar uma pessoa de quem você não gosta ajuda sua unidade de trabalho a alcançar seus objetivos, ainda que isso não beneficie você pessoalmente. Ou, como no caso do concorrente com um filho adoentado, se isso não beneficia a sua empresa, certamente traz um benefício para o cliente ao qual você pretende servir. A realidade subjacente da misericórdia é que a misericórdia beneficia alguém além de você mesmo.

Um ambiente de perdão em uma empresa oferece outro resultado surpreendente. Ele melhora a performance da organização. Se alguém comete um erro numa empresa na qual a misericórdia não é demonstrada, é bem provável que a pessoa não diga nada em relação àquilo, na esperança de que o erro não seja notado e que a pessoa não seja responsabilizada.

Isso diminui o desempenho de duas maneiras. A primeira é que um erro encoberto pode ser muito mais difícil de ser tratado posteriormente. Imagine um trabalho de construção no qual um trabalhador comete um erro no preenchimento de uma fundação. É fácil consertar o problema se ele for trazido à luz e reparado imediatamente. Mas será muito caro consertar depois que a estrutura estiver construída e a fundação enterrada. A segunda maneira é que a melhor experiência de aprendizado surge do aprendizado a partir dos erros. Como Soichiro Honda disse, “o sucesso só pode ser alcançado através do fracasso repetido e da introspecção. O fato é que o sucesso representa o 1% do seu trabalho que surge somente depois de 99% daquilo que é chamado de fracasso”.[1] As organizações não terão oportunidade de aprender se os erros não forem analisados.

“Bem-aventurados os puros de coração, pois verão a Deus” (Mateus 5.8)

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A sexta bem-aventurança ecoa Salmos 24.3-5:

Quem poderá subir o monte do SENHOR? Quem poderá entrar no seu Santo Lugar? Aquele que tem as mãos limpas e o coração puro, que não recorre aos ídolos nem jura por deuses falsos. Ele receberá bênçãos do Senhor, e Deus, o seu Salvador lhe fará justiça.

A frase “as mãos limpas e o coração puro” denota integridade, singeleza de devoção, lealdade plena. Ter integridade vai muito além de evitar o engano e o mau comportamento. A raiz da integridade é a inteireza, o que significa que nossas ações não são escolhas que fazemos ou deixamos de fazer em função da conveniência, mas que se baseiam na totalidade do nosso ser. Perceba que Jesus pronuncia a bênção de ser puro de coração não imediatamente depois da bênção de ter fome de justiça, mas depois da bênção de mostrar misericórdia. A pureza de coração surge não da perfeição de nossa vontade, mas do recebimento da graça de Deus.

Podemos determinar o quanto dessa bênção temos recebido ao perguntarmos a nós mesmos: qual é o meu compromisso com a integridade naquelas ocasiões em que consigo me livrar através de um engano habilidoso? Recuso-me a deixar que minha opinião sobre alguém seja moldada pela fofoca e pela insinuação, por mais atraente que isso possa ser? Até que ponto minhas ações e palavras são um reflexo preciso daquilo que está no meu coração?

É difícil argumentar contra a integridade pessoal no ambiente de trabalho, mas, em um mundo caído, ela costuma ser alvo de piadas. Assim como a misericórdia e a humildade, ela pode ser vista como fraqueza. Mas são as pessoas de integridade que “verão a Deus”. Embora a Bíblia seja clara ao afirmar que Deus é invisível e que “habita em luz inacessível” (1Timóteo 1.17; 6.16), o puro de coração pode perceber e sentir a realidade de Deus em sua vida. De fato, sem integridade, a falsidade que propagamos contra outras pessoas terminará nos tornando incapazes de perceber a verdade. Inevitavelmente começamos a acreditar em nossas próprias falsificações. Isso leva à ruína no ambiente de trabalho, porque trabalho baseado em algo irreal logo se torna ineficiente. O impuro não tem desejo de ver a Deus, mas aqueles que fazem parte do Reino de Cristo são bem-aventurados porque enxergam a realidade como ela verdadeiramente é, incluindo a realidade de Deus.

“Bem-aventurados os pacificadores, pois serão chamados filhos de Deus” (Mateus 5.9)

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A sétima bem-aventurança leva todo cristão à tarefa da resolução de conflitos. Os conflitos surgem toda vez que pessoas têm diferenças de opinião. Em um mundo caído, a tendência é ignorar o conflito ou suprimi-lo usando força, ameaça ou intimidação. Mas todas essas são violações da integridade (a sexta bem-aventurança) das pessoas em conflito. No Reino de Deus, é uma bênção reunir pessoas que estão em conflito. Somente assim é possível resolver o conflito e restaurar os relacionamentos. (Mais adiante neste artigo exploraremos o método de Jesus para a resolução de conflitos, apresentado em Mateus 18.17-19).

O resultado da resolução do conflito é a paz, e os pacificadores serão chamados “filhos de Deus”. Eles refletirão o caráter divino em suas ações. Deus é o Deus da paz (1Tessalonicenses 5.23) e mostramos que nós mesmos somos seus filhos quando buscamos promover a paz no ambiente de trabalho, na comunidade, em nosso lar e no mundo inteiro.

“Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça“ (Mateus 5.10)

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A oitava e última bem-aventurança pode nos parecer negativa. Até este ponto, as bem-aventuranças se concentraram em humildade, mansidão, relacionamentos justos, misericórdia, pureza de coração e pacificação — todas elas qualidades positivas. Mas Jesus inclui a possibilidade de perseguição “por causa da justiça”. Isso surge em razão das sete anteriores, porque as forças que se opõem aos caminhos de Deus ainda detêm grande poder no mundo.

Perceba que a perseguição que surge a partir de um comportamento injusto não é abençoada. Se falharmos por nossas próprias faltas, devemos esperar sofrer consequências negativas. Jesus está falando sobre a bênção de ser perseguido por fazer o que é certo. Mas por que seriamos perseguidos por causa da justiça? A realidade em um mundo caído é que, se demonstrarmos justiça genuína, muitos nos rejeitarão. Jesus detalha a questão ao destacar que os profetas — que, como ele, anunciaram o Reino de Deus — foram perseguidos. “Bem-aventurados serão vocês quando, por minha causa, os insultarem, perseguirem e levantarem todo tipo de calúnia contra vocês. Alegrem-se e regozijem-se, porque grande é a recompensa de vocês nos céus, pois da mesma forma perseguiram os profetas que viveram antes de vocês” (Mateus 5.11-12). Pessoas justas no ambiente de trabalho podem estar sujeitas a perseguição ativa e até mesmo severa da parte de pessoas que se beneficiam — ou que acreditam que se beneficiam — da injustiça presente ali. Se, por exemplo, você defender pessoas que são vítimas de fofoca ou discriminação em seu ambiente de trabalho (ou se simplesmente tiver amizade com elas), espere perseguição. Se você for presidente de uma associação comercial e se opuser a um subsídio acima do normal que seus membros estejam recebendo, não espere ser reeleito. A bênção é que a perseguição ativa pelo comportamento correto indica que os poderes das trevas acreditam que você está sendo bem-sucedido em propagar o Reino de Deus.

Até mesmo as melhores organizações e as pessoas mais admiráveis ainda estão manchadas pela Queda. Ninguém é perfeito. A oitava bem-aventurança serve como um lembrete a nós de que trabalhar em um mundo caído exige coragem.